domingo, 31 de maio de 2015

Vingadores: Era de Ultron


Por Daniel Esteves de Barros.
Avaliação: *** (Bom Filme).

 
 



Ficha técnica:
Título Original:  Avengers: Age of Ultron.
Gênero: Ação / Aventura / Ficção Científica.
Tempo de Duração: 142 minutos.
Ano de Lançamento: 2015.
Site Oficial: http://marvel.com/movies/movie/193/avengers_age_of_ultron
País de Origem: Estados Unidos da América.
Direção: Joss Whedon.
Roteiro: Joss Whedon, baseado em obra de Stan Lee e Jack Kirby.
Elenco: Robert Downey Jr. (Tony Stark / Homem de Ferro), Chris Evans (Steve Rogers /Capitão América), Mark Ruffalo (Bruce Banner / Hulk), Chris Hensworth (Thor), Scarlett Johansson (Natasha Romanoff / Viúva Negra), Jeremy Renner (Clint Barton / Gavião Arqueiro), Cobie Smulders (Agente Maria Hill), James Spade (Ultron), Aaron Taylor-Johnson (Pietro Maximoff / Mercúrio), Elizabeth Olsen (Wanda Maximoff / Feiticeira Escarlate), Paul Bettany (Visão), Samuel L. Jackson (Nick Fury), Stellan Skasgard (Dr. Eric Selvig), Don Cheadle (James Rhodes / Máquina de Combate), Linda Cardellini (Laura Barton),
Thomas Kretschmann (Barão Wolfgang von Strucker),  (Sam Wilson / Falcão), Andy Serkis (Ulysses Klaw), Hayley Atwell (Peggy Carter)  e Julie Delpy (Madame B).

Sinopse: 
Tentanto proteger o planeta de ameaças como as vistas no primeiro Os Vingadores, Tony Stark busca construir um sistema de inteligência artifical que cuidaria da paz mundial. O projeto acaba dando errado e gera o nascimento do Ultron (voz de James Spader). Capitão América (Chris Evans), Homem de Ferro (Robert Downey Jr.), Thor (Chris Hemsworth), Hulk (Mark Ruffalo), Viúva Negra (Scarlett Johansson) e Gavião Arqueiro (Jeremy Renner) terão que se unir para mais uma vez salvar o dia (Adoro Cinema).

The Avengers – Trailer:
 
 
 
Crítica:

 

Cada vez mais, entendo o êxodo deste grande público das telonas para as “telinhas”. Afinal, de uns tempos pra cá, o Cinema acabou sendo “floodado” por uma enxurrada de divertidos (até certo ponto) filmes de super-heróis, mas com pouca personalidade. E a culpada por isso tudo é a gananciosa da Dona Marvel, sim senhor! Nada contra os blockbusters do tipo, já que são eles que têm pagado o almoço da galera, lá em Hollywood, mas, convenhamos, já encheu os pacovás, né?

 

Tudo virou motivo pra se pensar em super-herói agora! Vamos fazer um Vingadores? Beleza, mas antes vamos aproveitar o gancho pra lançar um filme meia-boca do Thor, um bonzinho do Capitão América e dois divertidos do Homem de Ferro! Vamos fazer um segundo Vingadores? Demorou, mas antes vamos reaproveitar o gancho pra lançar outro filme meia-boca do Thor, uma ótima continuação do Capitão América e outro do Homem de Ferro, só que este vai ser bem meia-boca em comparação aos anteriores (afinal, já fizeram dois filmes bons com o mesmo herói. Um terceiro já seria utópico demais, né?)! Fora os Guardiões da Galáxia, os Homem-Aranha e os X-Men que têm por aí e que são, sim, muito bons, mas, inegavelmente, mais do mesmo.

 

E confesso que essa sequência descarada de caça-níqueis igualmente descarados não seria ao todo ruim, não fosse um porém: na grande maioria dos casos (e é claro que há as exceções), os filmes da Marvel (ou baseados nos quadrinhos dela) não conseguem criar um vilão realmente convincente em seus propósitos. Sabe o que fazia a trilogia do Batman (o segundo principal personagem da DC Comics, “rival” da Marvel, nos quadrinhos), dirigida pelo Nolan, ser eficaz? Não, nem de longe era o próprio Batman, mas sim o estudo dos antagonistas que confrontavam o personagem-título. Todos muito bem construídos e convincentes em seus planos luciferianos que funcionavam bem justamente por não serem tão escancaradamente luciferianos assim (ou melhor, eram bastante luciferianos, na verdade, mas tinham lá o seu “quê” de nobreza). Você cria uma empatia considerável pelo Ducard, ainda maior pelo Coringa (Ledger ganhou até um Oscar (merecidíssimo, diga-se) póstumo pelo personagem. Vai falar o quê?) e um pouco menor pelo Bane (mas, ainda assim, acaba criando) exatamente pelo fato de eles terem uma ideologia bem trabalhada por trás de suas figuras quase sempre bizarras.

 

Eis que a Marvel me dá um belo de um tapa na cara e lança aquilo que, sem um pingo de dúvida, trata-se de seu melhor produto audiovisual forever and ever and ever: Demolidor! Para o Cinema? Não. Para a “telinha”, é claro. Para o serviço de streaming: Netflix. E aí volto à afirmação realizada no início deste texto: “Cada vez mais, entendo o êxodo deste grande público das telonas para as “telinhas”...”. Se a porcaria do filme com o Ben Affleck foi mais feio do que passar graxa no andador da vó, em festa de família feita em casa assobradada, a série produzida por Drew Goddard é, sinceramente, uma aula de se fazer Cinema... só que na televisão.

 

Parei para pensar então se Vingadores: Era de Ultron iria aprender, ao menos um pouco, com as treze aulas dadas ao longo dos treze episódios de Demolidor e fazer algo parecido. A resposta foi, certamente, negativa.

 

Negativa, em especial, no quesito vilão. Por mais que o CGI seja muitíssimo bem empregado e nos presenteie com robôs dotados de movimentos surpreendentemente orgânicos – além do excelente trabalho da equipe de captura, que registra magistralmente os trejeitos do ator James Spade que, por sua vez, emprega um tom de voz perfeito na composição do personagem-título – o roteiro peca de forma homérica ao praticamente “vomitar” em nossa frente um robô com um senso de sarcasmo humanizado demais para que possamos comprar a ideia e uma necessidade inexplicavelmente imediatista de aniquilar a nossa espécie, por considerá-la alarmantemente perigosa, assim, do nada.

 

De forma alguma isto seria um problema (muito pelo contrário, poderia ser o grande trunfo do filme, assim como ocorreu, pelo menos, com os dois primeiros Batman, do Nolan, que já mencionei neste texto) caso o roteiro tivesse trabalhado com cautela o desenvolvimento de seu antagonista. O problema é que aqui bastam quinze segundos de “Tratamento Ludovico” (só pra não perder o costume de citar, do modo mais inapropriado possível, um filme cult no meio de uma crítica de um filme mega mainstream) para transformar Ultron, que, até então, seria o “protagonista mecanizado da paz mundial”, em uma espécie de “personificação mecanizada de músicas de splatter metal que pregam a obliteração da humanidade”.

 

Parte destas falhas ligadas ao vilão da vez, entretanto, poderia ser perdoável, caso ela se resumisse ao modo apressado com que o roteiro trabalha a sua personalidade nada aprofundada, o que não nos faz criar a empatia necessária para que possamos engoli-lo numa boa. O problema é que aquele defeitinho básico que tínhamos no primeiro filme se repete aqui, só que em uma escala infinitamente maior: são raros os momentos em que o antagonista coloca os heróis em xeque pra valer.

 

Quem já leu as HQs (eu já li algumas, mas confesso não ser lá um grande fã delas), sabe que Ultron tem dado muito baile nos Vingadores desde os anos 1960. De lá pra cá, o vilão já esculachou os super-heróis várias vezes, inclusive quando estes se encontravam ao lado do Quarteto Fantástico e dos Inumanos. Aliás, acabo de me lembrar que na própria HQ homônima (uma série em dez volumes, salvo engano), o vilão robótico literalmente venceu, e de forma definitiva, Homem de Ferro, Capitão América, Hulk e cia., sobrando pro Wolverine e pra Mulher Invisível reverterem a situação (e olha que ambos sequer são Vingadores).

 

Na adaptação cinematográfica, porém, Ultron não consegue atingir sequer 10% da periculosidade que ele atingia nos quadrinhos. Aqui, definitivamente, a maior ameaça aos Vingadores parece ser, mais do que nunca, eles mesmos (e, sim, sei muito bem que estes conflitos internos ligados ao grupo terão grande importância nos filmes que virão a seguir, mas isso não dá aos roteiristas o direito de não atribuir grandes desafios externos ao mega grupo heroico). Tanto que a cena de ação mais empolgante que podemos acompanhar em Era de Ultron é uma luta entre o Caça Hulk (que nada mais é do que uma versão anabolizada do Homem de Ferro) e o Hulk, cujo único propósito narrativo é dar um “sossega leão” no grandalhão verde.

 

Por falar em cenas de ação, muita gente tem reclamado do excesso delas, entretanto, a grande falha neste quesito está ligada realmente à qualidade delas e não à quantidade. Qualidade esta que falta neste segundo filme por culpa de Joss Whedon que, ao contrário da fita anterior, não consegue captar de forma eficiente a grandiloquência de seus planos. Vai ver que isso acontece simplesmente porque Whedon não tem lá grandes planos aqui. Uma coisa é você querer destruir boa parte de Manhattan e terminar com o Homem de Ferro atravessando um portal intergaláctico com uma bomba nuclear nas costas, outra coisa completamente diferente é você querer destruir uma cidade de porte médio e pertencente a um país fictício (Sokovia) de autoria da própria Marvel que fica ali, perdidaço entre a Sérvia, a Macedônia, a Grécia, a Bulgária e a Romênia.

 

Evidentemente, o tom grandioso que Whedon conferiu às cenas de ação do longa original não poderia ter sido empregado quase que literalmente aqui. O diretor tinha que saber trabalhar muito conteúdo em pouco espaço e, para tal, o ideal seria uma direção que contivesse planos mais aproximados e uma câmera comandada por uma mão bem menos pesada. Fato que raramente acontece e faz com que Vingadores: Era de Ultron acabe pecando terrivelmente por ter muita coisa interessante acontecendo durante a sua ação, mas um diretor que as registra trabalhando no piloto automático, sem empregar a energia necessária para tal (salvo em um conflito, ocorrido no centro de uma igreja da Sokovia, em que Whedon adota um plano plongée para focar todos os heróis).

 

Pouco conveniente também é a direção de Whedon nos momentos mais intimistas da equipe. Outro ponto que imaginei que as obras cinematográficas da Marvel poderiam ter aprendido com a série Demolidor é o uso de câmera na mão enquanto emprega primeiros planos para filmar os rostos dos super-heróis, algo que os humanizaria de forma visivelmente mais convincente e realista. Logo, por mais que o roteiro (também assinado por Whedon) tome os devidos cuidados e realmente consiga nos tornar mais próximos de Banner/Hulk, por intermédio do dilema “médico/monstro” (muitíssimo bem trabalhado aqui, por sinal), bem como Thor também cria uma afinidade muito maior com o espectador ao temer que o Capitão América consiga empunhar o seu martelo, Mjölnir - o que não apenas registraria uma suposta fragilidade do asgardiano, ao colocá-lo no mesmo patamar que o de um humano, como também faria com que este pudesse, quem sabe, enfrentar dilemas existenciais fazendo-o rever os seus conceitos sobre dignidade – é uma pena que a câmera não consiga andar de mãos dadas com o script, quebrando assim um ciclo simbiótico indispensável para a manutenção de uma estrutura narrativa realmente firme.

 

Enfim, passei mais de mil e quinhentas palavras de crítica detonando Era de Ultron, como posso justificar então os três asteriscos da nota (com preguiça de criar um indicador de avaliação mais bem elaborado), que conferem à produção uma qualificação moderadamente boa? Simples, o filme diverte o tempo todo. Não, não diverte da mesma forma que o original, com piadas que realmente funcionavam. Aqui, o humor é inconveniente, trabalhado com uma má vontade imperdoável e ainda temos uma série de subtramas desnecessárias (Thor e as joias do infinito, o romance entre dois personagens e a família do Gavião Arqueiro) que atrapalham excessivamente o desenvolvimento de personagens que mal nos são apresentados, que é o caso do Mercúrio, da Feiticeira Escarlate e do Visão. Mas, ainda assim, trata-se de uma produção que diverte, que nos entretém, que em momento algum nos faz olhar para o relógio.

 

As cenas de ação, em sua maioria, estão longe de serem bem dirigidas (os diretores do próximo Vingadores serão os irmãos Joe e Anthony Russo, que assinaram a direção do ótimo Capitão América: Soldado Invernal, o que não deixa de nos dar uma bela d’uma pontada de esperança), mas estão, sim, bem distribuídas pelo roteiro e são otimamente coreografadas. Fora, claro, os efeitos visuais, que começam ilustrando, com todo o realismo do mundo, rachaduras formando-se em prédios e terminam suspendendo praticamente uma cidade inteira há vários metros de altura. Sem contar que, em sua única vantagem com relação ao primeiro filme, esta segunda parte ao menos se preocupa em arregaçar as mangas de cada um de seus Vingadores e possibilita com que todos demonstrem as suas habilidades durante as batalhas, ao contrário do anterior que só abria espaço para o Homem de Ferro, a Viúva Negra (por mais que ela seja subestimada, Natasha Romanoff tá lá, toda sexy e gostosa em cena, sem poderes especiais e dando o melhor de si (além do corpo da Scarlett Johansson) pra desativar o cajado do Loki) e, claro, o Hulk, por mais que Ultron se apresente tão inofensivo aqui que acredito que um único Vingador daria conta dele, caso o roteiro não forçasse tanto a barra.

 

É o filme perfeito pra se assistir com um balde de pipoca jumbo e um copo de refrigerante de um litro (algo que fiz em Mad Max: Estrada da Fúria, que é muito mais decente que este Vingadores 2, mas isso comento em outra ocasião), todavia, vamos combinar: se for pra Marvel Studios nos fazer sair de casa, encarar uma insuportável fila e nos entregar um produto que esteja apenas na média, é melhor mesmo eles seguirem investindo em produções com orçamentos infinitamente mais enxutos para a televisão, as quais podemos assistir no conforto de nosso lar e testemunharmos um complexo conflito travado entre personalidades ainda mais complexas, como é o caso de Matthew Murdock e Wilson Fisk.