Por Daniel Esteves de Barros.
Avaliação: **** (Ótimo Filme).
Título Original: Rise of the Planet of the Apes.
Gênero: Ficção-Científica.
Tempo de Duração: 105 minutos.
Ano de Lançamento: 2011.
Site Oficial: http://www.apeswillrise.com
Países de Origem: Estados Unidos da América.
Direção: Rupert Wyatt.
Roteiro: Ricky Jaffa e Amanda Silver, baseados em personagens criados
por Pierre Boulle.
Elenco: Andy Serkis (Cesar), James Franco (Will
Rodman), Freida Pinto (Caroline Aranha), John Lithgow (Charles Rodman), Tom
Felton (Dodge Landon), Brian Cox (John Landon), Tom Felton (Draco Malfoy),
Tyler Labine (Franklin), Jamie Harris (Roy), Leah Gibson (Alyssa Williams),
David Oyelowo (Steve Jacobs), Chelah Horsdal (Irena), Karin Konoval (Maurice),
Richard Ridings (Buck), Terry Notary (Alfa / Olhos Brilhantes), Jesse Reid
(Donnie), Mattie Hawkinson (Linda), Christopher Gordon (Koba) e Devyn Dalton
(Cornelia).
Sinopse: San Francisco. Will Rodman (James
Franco) é um cientista que trabalha em um laboratório onde são realizadas experiências
com macacos. Ele está interessado em descobrir novos medicamentos para a cura
do mal de Alzheimer, já que seu pai, Charles (John Lithgow), sofre da doença.
Após um dos macacos escapar e provocar vários estragos, sua pesquisa é
cancelada. Will não desiste e leva para casa algumas amostras do medicamento,
aplicando-as no próprio pai, e também um filhote de macaco de uma das cobaias
do laboratório. Logo Charles não apenas se recupera como tem a memória
melhorada, graças ao medicamento. Já o filhote, que recebe o nome de César,
demonstra ter inteligência fora do comum, já que recebeu geneticamente os
medicamentos aplicados na mãe. O trio leva uma vida tranquila, até que, anos
mais tarde, o remédio para de funcionar em Charles e, em uma tentativa de defendê-lo,
César ataca um vizinho. O macaco é então engaiolado, onde passa a ter contato
com outros símios e, cada vez mais, se revolta com a situação (
Adoro
Cinema).
Rise of the Planet of
the Apes – Trailer:
Crítica:
* Primeiro: já assisti a “Planeta dos Macacos” (a versão original, com o Charlton “Ben-Hur” Heston e tal...), “De Volta ao Planeta dos Macacos” e ao
malhado “Planeta dos Macacos”,
comandado pelo doidão excêntrico do Tim Burton.
* Segundo: isso foi há muiiiiiiiito tempo (tipo, há uns
quatro ou cinco pares de anos, não me recordo ao certo), portanto, quase que
não me lembro de nadica de nothing das versões
anteriores.
* Terceiro: não, o fato de eu não me lembrar de quase que nadica
de nothing das versões anteriores em
nada me influenciou na apreciação quase que completa desta obra em questão.
* Quarto: sim, se você não assistiu a nenhum dos “Planeta dos Macacos” anteriores, pode
correr pro cinema sem medo de ver este “...A
Origem”, que você vai curti-lo do mesmo jeito... ou não.
* Quinto: tsc... não tem quinto, vamos parar de enrolar e
bora começar a trabalhar logo...
Bom, soltei essa no Twitter e, claro, reproduzo por aqui
também: “fazia muito tempo que não via um
filme construir tão bem o fenômeno de identificação público/ personagem, sobre
os alicerces do Complexo de Édipo, quanto este “Planeta dos Macacos: A Origem”
constrói”.
O quê?! Não entenderam p*rra nenhuma?! Oras, e desde quando
a crítica de cinema tem a função de explicar, ao invés de complicar? Tamos aqui
é pra gerar dúvidas mesmo, e não respostas. Respostas tornam tudo muito óbvio.
Querem uma prova? Ok, tornemos a coisa toda bastante óbvia a partir de agora
(e, se você não se interessa por teorias malucas envolvendo a linguagem
cinematográfica, pule logo pro próximo parágrafo do próximo parágrafo... não,
não pro próximo do próximo... mas sim pro próximo do próximo do próximo...
isso, pula pra esse aí que começa com “Se
essa birutice toda escrita aí...”).
Uma teoria que comento até que bastante por aqui (o que não
quer dizer que eu concorde super com ela, mas vá lá...), é a tal da teoria do
fenômeno de identificação personagem/público. Como isso ocorre? Bom, tentarei
ser breve (tentarei p*rra nenhuma, vocês que leiam tudo, seus folgados!).
Começa com o Complexo de Édipo, quando temos uma “paixonite” pela nossa mãe (não,
a coisa não vai descambar pro incesto, prometo). Nascemos desprotegidos, em um
mundo, até então, desconhecido. Choramos, queremos voltar pro útero, mas isso
não rola. Vamos então pros braços da nossa mãe e somos amamentados, resultando no
primeiro contato diretamente físico (quer dizer: sem luvas cirúrgicas
envolvendo as mãos que nos seguram, ou coisas do tipo) com um ser humano e que
nos oferece uma primeira recompensa (o alimento). Como não sentirmos um apreço
todo especial por nossa mãe, logo após ela nos envolver nos braços e nos dar um
presente de “feliz primeiro dia de vida”? Mas aí chega o pai, todo barbado,
soado, fedidão, troglodita, peludo, e o malandrão vai e arranca o nosso “primeiro
amor”, passando, involuntariamente, a dividi-la conosco. Cria-se então um
embate psicológico escondidinho bem ali, no subconsciente do bebê. O pai não se
manca da situação toda, é claro, mas o recém-nascido fica com o “sangue no olho”.
O problema, porém, é a diferença abissal entre os dois pólos
dessa “batalha” afetuosa. De um lado, o projenitor, gigante diante de nós, e
também detentor dos afetos da signora
nostra madre. De outro lado, o bebê,
minúsculo, frágil, e com cara de joelho, que malemá sabe fazer outra coisa,
senão chorar (e sujar a fralda também... enfim... eu tava falando do Complexo
de Édipo e tal... né? Voltemos). Sentiram o drama? Por mais que cresçamos e nos
tornemos uns cavalos insensíveis, essa pequena grande “injustiça”, “imposta”
pelo nosso “velho”, pra sempre martelará o nosso subconsciente. E é justamente
(ou não) por este motivo que nos relacionamos com o lado mais fraco de uma
disputa, afinal, sem nem perceber, nos espelhamos sempre nos mais fracos e
oprimidos (e você achando que era todo bonzinho porque ficava com dó quando o
Seu Madruga batia no Chaves, né?). É justamente (ou não) por este motivo que
torcemos pro São Caetano bater o Vasco (a não ser que você seja vascaíno, é
claro), na final da pseudo-copa alcunhada João Avelange, em 2001, mesmo não
tendo nada (ou não) contra o time carioca da faixa preta diagonal. Por fim, é
justamente (ou não) por este motivo que torcemos pra que os mocinhos triunfem
nos filmes. Não é uma simples questão moral, mas sim de identificação com a
ponta mais fraca da corda (ou alguma vez você já torceu pr’um mocinho derrotar um
vilão que impõe desafios relativamente menores à sua capacidade de resolvê-los?).
Se essa birutice toda escrita aí em cima é válida, não me
arrisco a dizer (confesso que, apesar de respeitá-la pra burro, considero-a um
pouquinho fatalista demais, digamos assim), mas a verdade é que em “Planeta dos Macacos: A Origem” ela
parece fazer todo o sentido. Mesmo, essa teoria aparentemente sumariada é posta
em prática aqui e funciona toda lindona.
Mesmo! Afinal, por que torceríamos pr’um bando de macacos
que se opõem tão conflitantemente à nossa própria raça? A resposta é que, tanto
o roteiro, de Amanda Silver e Rick Jaffa, quanto à direção, de Rupert Wyatt,
investem satisfatoriamente nas situações às quais o protagonista-chimpanzé
Cesar (e também os seus comparsas de jaula) acaba sendo submetido, sofrendo
humilhações, sentindo-se excluído, levando surras e, por um tantinhozinho
assim, não chega a ficar parecido comigo, em meu ambiente de trabalho.
Mas e quando a macacada começa a botar pra quebrar e kick some asses da moçada comedora de x-burgers e bebedora de milk shakes? Aí, meu amigo, por mais que
apoiemos super a causa dessa galerinha peludaça, e com ideais inspirados na
contracultura punk (ainda que eles
nem façam ideia do que seja isso), o Complexo de Édipo, escondido lá no
cantinho do nosso armário cerebral, nos dá mais um puxãozinho de orelha e
passamos a torcer pra que a cowboyzada
de terno, por mais canalha que se apresente no filme, consiga, ao menos, sair
ilesa dos ataques dos símios.
Não é exagero nenhum, por sinal, afirmar que “Planeta dos Macacos: A Origem” é desses
filmes em que a gente fica perdidão, decidindo pra quem devemos, de fato,
torcer pra vencer o conflito. E isso, é claro, é um ponto extremamente positivo
do longa, uma vez que percebemos o quão visível é o poder de redenção do
cinema, que utiliza um método tão simples (e tão complexo, ao mesmo tempo) pra
fazer com que deixemos um pouco de lado os nossos posicionamentos morais pra
nos identificar integralmente com o protagonista anti-herói, o chimpanzé esperto
Cesar.
E o pouco conhecido Rupert Wyatt (dirigiu apenas três longas
e um curta) parece ter as manhas e dá o tom da coisa toda por aqui. Abrindo o
filme com uma perseguição que ganha muita dinâmica através de ângulos que
filmam a floresta, palco da ação, em 90º e com a câmera na mão, Wyatt logo
utiliza alguns recursos da montagem de Conrad Buff IV e Mark Goldblatt pra
dar agilidade narrativa pra “Planeta... A
Origem” já em seu início, quando ilustra uma elipse com um close no olho castanho de uma chimpanzé
e a encerra com um zoom out no mesmo
olho – mas agora com uma tonalidade mais brilhante (e o nome dado ao bicho, “Olhos
Brilhantes”, logo se revela uma clara homenagem ao também ótimo longa original)
– resultando quase que num raccord.
Os planos-sequências (que, por sinal, também assumem a
função de elipse) que ilustram a evolução etária de Cesar, também são amostras
da competência de Wyatt, que, de forma rápida e dinâmica, percorrem longos
períodos de três ou cinco anos enquanto mostra o excêntrico “bichinho de
estimação” (que o personagem de Franco jura não ser bicho de estimação, mas sim
uma espécie de filho pra ele) brincando na casa de seu “proprietário” ou pulando
de galho em galho em uma floresta que passa a ser um cenário pra lá de
importante pro filme.
E se engana quem pensa que o jovem diretor pára de utilizar
certas convenções da linguagem cinematográfica por aí. Wyatt ainda captura o
início da farra que a macacada começa a tocar através de tomadas aéreas que
ilustram perfeitamente uma área verde sendo dominada por diversos pontinhos
negros que começam a se organizar. Há também o emprego de um travelling rotatório de 360º, que torna
uma sequência envolvendo um helicóptero ainda mais eletrizante e, pra botar de
vez a cereja no bolo (e, se você ainda não assistiu a esse longa, ou ao longa
original ou ao do Tim Burton, que seja, pule pro próximo parágrafo, ou dará com
os burros n’água, ou melhor, no spoiler que
vem a seguir), o modo como o plano final é conduzido, com os chimpanzés no topo
de árvores que são filmadas sob uma perspectiva superior à mais alta torre de
San Francisco, indicando que, apesar de terem
vencido uma única batalha, os símios já atingiram uma posição que passou
a colocá-los num patamar acima de nossa própria civilização, o que viria a
resultar no domínio daquela espécie sobre a nossa, tema da produção sessentista.
Falando em tema, se o filme estrelado por Heston dava um ar
meio que parecido com o final do ótimo cult
italiano “A Classe Operária Vai ao
Paraíso” pra coisa toda, neste “Planeta
... A Origem” a tal da “classe
operária” acaba sendo mais destacada aqui (no orignal, a “classe operária”
daqui assume uma outra função, que não revelarei qual é pra não cometer mais spoilers), começando pelas relações de
domínio/submissão. Logo, pequenos grandes detalhes que ilustram tal “embate
social” passam a fazer toda a diferença, como a coleira colocada em Cesar, o
dedo do vizinho de William apontando pro pai do rapaz, o primeiro beijo que o
personagem de Franco tasca na personagem de Freida Pinto (ia botar só o
sobrenome da moça, mas ia pegar mal pra burro) e desperta o Complexo de Édipo –
ainda que com uma inversão quanto ao sexo – no bicho (mas dessa vez o “Complexo
de Édipo” aqui é mais direto, e não tão viajadaço como eu citei lá em cima, no
começo do texto). Todos estes detalhes aparentemente corriqueiros colaboram, em
maior ou menor grau, pra formação bakunista/marxista (mais marxista do que
bakunista, conforme constatamos na máxima “a união faz a força”, representada
na estória do graveto entre Cesar e Maurice, extraída da cRássica fábula do
fazendeiro e dos quatro filhos...
isso... aquela mesma que você aprendeu no primário) do protagonista
literalmente animal.
Outra teoria bacana que se pode sacar assistindo ao filme é
a do criador e da cria, ou, de certa forma, do pai e do filho. Assim como
nossos pais, Will é a pessoa na qual Cesar se espelha durante a sua infância. Provavelmente,
por estar iniciando a sua vida social aos poucos e não ter opinião formada
sobre nada, Will (assim como o progenitor de cada um de nós) é a base de Cesar
pra tudo, porém, ao abandonar a infância e atingir a pré-adolescência, o
chimpanzé (bem como nós mesmos) começa a sentir-se deslocado do mundo o qual
foi inserido e nem sempre os dizeres de seu “pai” se encaixam tão bem quanto
ele gostaria. A cria passa então a agir de um modo adverso aos ensinamentos do
criador, e o último, visando a segurança do primeiro, adota algumas medidas
repressoras que não são muito bem compreendidas pelo “filho”, que passa a
questionar a sua submissão perante o “pai”.
Porém, a teoria envolvendo uma luta de classes acaba
realmente sendo mais plausível aqui e... o quê?! Tá, tá bom, chega de teorias malucas
sobre o embate entre homens e animais (que lembra muito um “A Revolução dos Bichos”, do George
Orwell, e... tá... tá... parei...) e voltemos ao filme.
Suplementado ainda por efeitos visuais que, longe de serem blasters-mega-powers, como os de um “Avatar” ou os de um “Piratas do Caribe – O Baú da Morte”,
conseguem, ao menos, dar vivacidade e movimentos naturais aos chimpanzés
digitalmente criados (simplificando: são criados por um processo semelhante ao
que deu vida ao Gollum e ao Davy Jones) e por cenas de ação que, apesar de
serem poucas, empolgam super quando bem realizadas por Wyatt e engrandecidas
pela marcante e poderosa trilha-sonora de Patrick Doyle, “Planeta... A Origem” dá lá as suas pisadas no tomate,
principalmente no tocante ao desenvolvimento de seus personagens.
O Will, do recém-indicado ao Oscar: James Franco, é até que
interessante, mas tá longe de ser original. É, no final das contas, um
cientista bonzinho e politicamente correto que ama o seu
macaquinho-cobaia-de-estimação e é impulsionado pela possibilidade de curar o
Alzheimer do pai. Já a Caroline, de Freida Pinto, é tão dispensável pra trama
que parece ter sido colocada aqui apenas pra mostrar o eficiente clareamento de
dentes que a atriz (e vale frisar que a atuação da moça não tá tão longe assim
de uma Megan Fox, em “
Transformers”,
só que menos vulgar e menos (tipo, bemmmm menos) canastrona) fez após a fama
alcançada com o apenas passável “
Quem
Quer Ser um Milionário?”. O Draco Mal... digo... o Tom Felton então,
xiiiiii, nem se fala. O cara parece fazer questão de reinterpretar o seu
personagem de “
Harry Potter” e o
roteiro cria uma caricatura insuportável de
bad
ass em cima do moço, tornando-o ainda mais insuportavelmente exagerado do
que já era na saga fílmica inspirada na saga literária de J. K. Rowling. A
diferença é que lá ele incomodava bem menos, já que aparecia bem menos.
Há também uma série de absurdos do tipo que nos fazem chamar
“truco!” dentro da sala de projeção (ou, como dizem uns amigos meus: “paia!”...
embora eu nunca tenha me ligado direito na relação dessa gíria com uma situação
mentirosa que nos é apresentada), como o fato de chimpanzés desenvolverem inteligência
o bastante para conseguirem falar (????????????????????... é... eu sei...), mas
o ponto fraco do longa fica realmente por conta dos personagens unidimensionais
e das atuações nada convincentes que o roteiro e seus personagens capengas
rendem (salvam-se Franco, com o seu carisma e a sua expressividade habituais, e
Serkis, que mesmo mais contido do que na pele do Gollum, ou do próprio “King Kong”, expressa-se bem o bastante
pra dar muita vida a seu Cesar, que delineia certinho os momentos de pura empolgação
e de pura frustração).
Ainda que não crie um momento tão surpreendentemente
marcante como o plano final da produção original, “Planeta dos Macacos: A Origem” é indispensável por revisar de
maneira bastante interessante temas que ficaram marcados em clássicos
literários, e até mesmo cinematográficos, por conter uma das melhores direções
do ano e, principalmente, por colocar em conflito a nossa torcida alternada
entre os dois pólos da ação. Afinal: torcemos pelos “mocinhos” rebeldes e
idealistas ou pelos vilões conservadores e que, em muitos momentos, utilizam as
suas respectivas armas apenas como autodefesa (embora a primeira opção seja
sempre a mais coerente e racional, naturalmente)?
Obs.: fiquei sem
acesso à net por muito tempo, portanto, é mais do que provável que todo mundo
que tá lendo esse artigo ultra-atrasado aqui (que foi publicado umas quatro ou cinco
semanas após ser escrito) já saiba que rola uma cena pós-créditos que indica
uma possível continuação da obra em questão, né?